domingo, abril 08, 2012

Se...

... existem leituras que me agradam particularmente são aquelas que me permitem conhecer mais da História do meu País e do mundo em que vivo. Tentar compreender porque motivo determinadas realidades existem nos dias de hoje. Compreender povos, compreender ideologias e pessoas que marcaram a Humanidade. Uma das fases da História que mais me fascina é a da Segunda Guerra Mundial. Apesar de ser descendente de um militar português que participou na Primeira Guerra Mundial, que lutou nas trincheiras e que regressou para a sua família, confesso que é a guerra que decorreu entre 1939 e 1945 que me desperta maior interesse. E não é à toa que tenho um lugar de destaque na mini-biblioteca aqui de casa para este assunto com livros desde biografias a descrições dia-a-dia do que foi acontecendo nestes terríveis anos da História Mundial.

Um dos últimos livros que li sobre este tema foi sobre Aristides de Sousa Mendes, o famoso cônsul português que, na cidade francesa de Bordéus, tantos vistos passou a famílias inteiras que tentavam escapar do tormento alemão que, à época, se parecia espalhar por toda a Europa como um verdadeiro polvo, com os seus tentáculos a tentarem chegar cada vez mais longe. Contra tudo e contra todos, este português lutou quase sozinho por uma causa que considerava mais justa e mais válida que todas as orientações que pudessem chegar do Governo Português de Salazar. Salvar todas as vidas humanas que conseguisse tornou-se o seu objectivo único e muitos são os descendentes de judeus por esse mundo fora que têm a agradecer a sobrevivência dos seus antepassados a este diplomata português.

O livro que li chama-se "Aristides de Sousa Mendes - Um Homem Bom", é de Rui Afonso, e aconselho a sua leitura para quem quiser saber um pouco mais sobre este diplomata português. Nesta leitura, o que mais me intrigou não foram as dificuldades que Sousa Mendes viveu no período durante a Guerra e nos anos que se lhe seguiram. Essas eram mais do que esperadas. Não me espanta todo o tratamento que lhe foi dado por Salazar e pelos seus ministros. Não me espanta que tenha sido retirado da carreira diplomática e que tenha sofrido as consequências esperadas dos seus actos. O que mais me intrigou foram as reticências que existiram em reabilitar a memória deste homem que apenas não cumpriu as orientações do seu governo por um bem maior. Muito sinceramente será algo que nunca compreenderei... E foi o que mais me deixou desconfortável ao terminar a leitura deste livro. Porque houve casos semelhantes de outras nacionalidades que, não concordando com as políticas em vigor, acreditaram que era possível salvar pessoas da Solução Final. Assim aconteceu com o sueco Raoul Wallenberg que detém, juntamente com Sousa Mendes, a cidadania honorária de Israel. Mas, porém, o sueco teve uma vida mais facilitada no seu objectivo: tinha a apoiá-lo o seu próprio governo... E logo Portugal que era um país tido como neutral pode fazer tão pouco...

"Em 1998, Sousa Mendes foi reintegrado a título póstumo no serviço diplomático português na categoria de embaixador. No mesmo ano, foi nomeado cidadão honorário de Israel, uma honra que partilha com o herói do Holocausto sueco Raoul Wallenberg. Seguiram-se selos, moedas comemorativas, monumentos, uma fundação para honrá-lo, ruas (incluindo uma em Viena) e inúmeras homenagens. A mais impressionante delas foi talvez a cerimónia no Parlamento Europeu, realizada em 1999, mais uma prova, se ela fosse necessária, de que Aristides de Sousa Mendes tinha agora o seu lugar na história e serviria de exemplo para o novo milénio."

"Que há de heróis como Raoul Wallenberg e Aristides de Sousa Mendes de tão perturbador para as sensibilidades ocidentais? Será que essas pessoas recordam alguma coisa que nós gostaríamos convenientemente de esquecer: o Holocausto e a cumplicidade ocidental no Holocausto? Nós preferiríamos esquecer, e esses grandes homens não nos deixam esquecer que, no século XX da chamada era cristã, homens e mulheres de uma religião diferente foram impiedosamente exterminados aos milhões enquanto a maior parte do mundo assistia sem nada fazer.
(...) Num tempo em que a Europa estava lançada numa corrida suicida e autodestruidora e poucos, como Jean Monnet em Londres, conseguiam ver um tempo em que a Europa renasceria das suas chamas como uma fénix, um representante diplomático de uma pequena nação, aparentemente insignificante, no extremo do continente pediu aos seus vizinhos estrangeiros que voltassem os olhos, tal como os seus antepassados tinham feito mais de quatro séculos antes, para Portugal; desta vez, em busca de um exemplo de liderança moral. Pelas suas acções abnegadas, Aristides de Sousa Mendes não só salvou a vida de inúmeros cidadãos de Espanha, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, França, Polónia, Checoslováquia e Áustria como deu aos outros europeus um perfeito exemplo dos valores que os uniam. Com o seu respeito pela vida humana e pelos direitos e a dignidade do Homem, Aristides de Sousa Mendes mostrou ser ao mesmo tempo um herói para a Europa e para a humanidade."

E disse Mordechai Paldiel ao filho de Sousa Mendes, João Paulo, no verão de 1988, quando finalmente foi plantada a árvore em honra de Aristides de Sousa Mendes no jardim do Yad Vashem:
"Como vê, a árvore ainda é pequena. Mas ela há-de crescer. Com o tempo, será perfeitamente visível para todos os visitantes do nosso jardim. E nenhum desses visitantes, ao olhar para a placa, perguntará: quem era Aristides de Sousa Mendes? Ninguém perguntará porque todos saberão".

Porque a História nunca deve ser esquecida para que não se possa repetir...

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